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Costumes para o mês de Elul
Costumes para o mês de Elul

Elul

A Divisão dos Meses Entre Yaacov e Essav

No Zôhar Hacadosh consta que Yaacov e Essav dividiram os me-

ses do ano. Nessa divisão, os meses de nissan, iyar e sivan ficaram com

Yaacov. Em nissan comemoramos Pêssach, em iyar fazemos a sefirat

haômer (contagem do ômer) e em sivan comemoramos a Outorga da

Torá.

Os três meses seguintes, em princípio, ficariam sob a influência

de Essav: tamuz, av e elul. Entretanto, desses três meses, Essav acabou

ficando somente com tamuz e uma parte de av. Yaacov Avínu tirou

dele todo o mês de elul e parte do mês de av. Qual passagem da Torá

nos ensina isso?

Depois de sair da casa de Lavan, Yaacov encontrou-se com Essav.

Nesse encontro, Essav fez uma proposta para Yaacov (Bereshit 33:12):

“Niss’á venelecha veelechá lenegdecha” – Ponhamo-nos a caminho e eu

caminharei junto contigo. Yaacov responde para ele (33:13-14): “Meu

senhor sabe que as crianças são tenras e se as ovelhas e as vacas que

têm cria se fatigarem em um só dia, morrerá todo o rebanho. Passe,

meu senhor, rogo, diante de seu servo, e eu irei devagar conforme o

trabalho que está diante de mim e conforme o passo dos meninos

até chegar a meu senhor, a Seir.”

Essav sugere a Yaacov que viajem juntos, porém Yaacov Avínu

queria poupar sua família. Temia que Essav fosse uma má influência

para ela.

Nossos livros sagrados mencionam que, neste versículo, as pri-

327

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

meiras letras das palavras “vaani etnahalá leiti lerêguel – e eu irei de-

vagar conforme” formam a palavra “elul”. Foi nesse encontro, que Yaa-

cov Avínu conseguiu tirar de Essav o mês de elul.

Nesse contexto, com as palavras “e eu irei devagar conforme o

trabalho que está diante de mim”, Yaacov estava afirmando que tem

um trabalho de retorno até o Todo-Poderoso, realizado no mês de

elul e em assêret yemê teshuvá, e que não abre mão dos trinta dias de

elul. Esses quarenta dias formam um bloco indispensável no processo

de teshuvá.

Mais adiante, no Chumash Bamidbar, há um outro trecho interes-

sante relacionado com este conceito.

Bil’am foi o maior profeta dos outros povos. Quando Balac pediu

para ele amaldiçoar o povo de Israel, Balac disse (Bamidbar 22:06):

“Veatá lechá ná ara li et haam hazê” – E agora vai, rogo-te, amaldiçoa

para mim este povo.

É interessante que as letras da palavra “ara” (amaldiçoa) – álef,

resh, hê – são as iniciais de elul e rosh hashaná.

Balac e Bil’am temiam as poderosas “armas” de Am Yisrael – elul,

Rosh Hashaná, assêret yemê teshuvá, Yom Kipur. Por isso, Balac disse

para Bil’am: ara li et haam hazê. Num plano mais simples, isso significa:

amaldiçoa para mim este povo. Em um plano mais profundo, significa:

toma deles elul e Rosh Hashaná. Mas eles não conseguiram seu intento,

pois Yaacov Avínu já tinha adquirido essa época no encontro com Essav.

Em parashat Ki Tetsê está escrito (Devarim 23:06): “Velô avá Ha-

shem Elokecha lishmoa el Bil’am – E não quis Hashem teu D’us ouvir a

Bil’am”. Em vez de “velô avá”, deveria estar escrito “velô ratsá”. Mas a

expressão “velô avá” é uma alusão ao fato de que o mês de av não foi

entregue totalmente para Essav. Até o décimo dia do mês de av per-

tence a Essav, mas daí em diante não. Dia nove de av, infelizmente, os

dois Templos Sagrados foram destruídos.

328

ELUL

Além desse acrônimo (rashê tevot) “elul”, há outros quatro no Ta-

nach. Estes acrônimos não são casuais. Não são apenas resultados

fortuitos de uma pesquisa em computador. Eles representam ensina-

mentos profundos transmitidos por nossos sábios.

O primeiro rashê tevot, que vimos acima (vaani etnahalá leiti le-

rêguel), nos ensina que necessitamos do mês de elul. Yaacov Avínu

capturou este mês de Essav e ele é imprescindível em nosso trabalho

espiritual nesta época. Esses dias são um preparativo para Rosh Ha-

shaná e, principalmente, para Yom Kipur. Seria trágico se elul estivesse

sob a influência de Essav. Yom Kipur é o dia sobre o qual consta: “Lifnê

Hashem tit’háru – Purifiquem-se perante D’us”. Em Yom Kipur alcança-

mos o nível espiritual supremo de estarmos “perante Hashem”.

Há outros quatro rashê tevot, dos quais os mais conhecidos são:

“Ani Ledodi Vedodi li – Eu estou para o meu Amado (D’us) e meu

Amado está para mim” (Shir Hashirim 06:03); “Umal Hashem Elokecha

et levavechá veet levav zar’echa – E circuncidará Hashem, teu D’us,

o teu coração e o coração de tua descendência” (Devarim 30:6);

“Umishloach manot ish lereêhu umatanot laevyonim – e de se enviar

porções uns aos outros e presentes aos pobres” (Meguilat Ester 09:22).

Esses três rashê tevot mencionados acima, exprimem a essência

do nosso trabalho em elul e assêret yemê teshuvá. Eles aludem às três

condutas fundamentais que conferem méritos, para se alcançar um

bom resultado em Rosh Hashaná e Yom Kipur: tefilá, teshuvá e tseda-

cá, conforme o dito: “Utfilá utshuvá utsdacá maavirim et rôa haguezerá

– A oração, o retorno ao caminho da Torá e a caridade revogam o mal

do decreto”.

“Ani Ledodi Vedodi li – Eu estou para o meu Amado (D’us) e meu

Amado está para mim” representa a oração.

“Umal Hashem Elokecha et levavechá veet levav zar’echa – E cir-

cuncidará Hashem, teu D’us, o teu coração e o coração de tua descen-

dência” representa a teshuvá.

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ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

“Umishloach manot ish lereêhu umatanot laevyonim – e de se

enviar porções uns aos outros e presentes aos pobres” representa a

tsedacá.

Analisemos agora o quinto rashê tevot que forma a palavra elul.

Ele está em Parashat Mishpatim. Lá a Torá narra sobre o rotseach bish-

gagá – alguém que infelizmente matou seu semelhsnte de forma in-

voluntária. A passagem que forma o acrônimo elul é (Shemot 21:13):

“Vehaelokim iná leyadô vessamti lechá macom... – E D’us lhe destinou

(que o homem seja morto) por sua mão; Eu lhe assinalarei o lugar...”.

Nesse trecho, a Torá trata de alguém que matou sem querer.

Embora tenha matado involuntariamente, com certeza havia algum

motivo para ter acontecido esta tragédia justo por seu intermédio.

O Talmud (Macot) ensina que dos Céus desdobram-se situações po-

sitivas (méritos) aos merecedores e situações dignas de punição aos

pecadores (megalguelim zechut al yedê zacay vemegalguelim chová al

yedê chayav).

Embora o assassino em questão ter matado sem querer, a Torá

atesta claramente que “D’us lhe destinou por sua mão”. Trata-se, por-

tanto, de uma situação que praticamente estava preparada para ele.

Ele merecia ser o causador da tragédia e o outro merecia morrer.

A Torá diz que um parente da vítima – chamado de goel hadam –

tem direito de matar o assassino involuntário, enquanto ele não fugir

para uma cidade abrigo (de refúgio).

Parashat Vaetchanan (Devarim 4:42) menciona sobre estas cida-

des de refúgio: “Venás el achat min hearim hael vachay – e fugirá para

uma destas cidades e viverá”.

Com o termo “vachay – e viverá”, a Torá determina que se dê para

este indivíduo condições de vida – tanto físicas quanto espirituais.

Por exemplo, se ele tem um rav, o rav precisa ir junto com ele para

a cidade de refúgio. Por conseguinte, se o rav tem outros discípulos,

como é de se esperar, a yeshivá toda deve acompanhá-lo. O Rambam

330

ELUL

escreve que, para aqueles que estão ligados à chochmá (sabedoria da

Torá), sem a chochmá elas não são chamadas vivas.

Sob o ponto de vista espiritual, o estudo de Guemará é tão im-

portante, quanto o pão e a água sob o ponto de vista material. A

Torá afirma, que devemos encontrar meios para que esse assassino

involuntário continue vivendo inclusive espiritualmente – com seu

estudo de Torá.

O que acontece com um guer (um prosélito sem parentes) que

foi morto de forma involuntária?

A Guemará (San’hedrin) diz que se estipula um goel hadam (vin-

gador) para ele. Mesmo não tendo familiares, o sujeito precisa de

alguém que seja seu vingador. Qual o sentido desta determinação?

O Rav David (conhecido com Rav Deivid Shelita, Rosh Yeshivat Pá-

chad Yitschac e genro do Rav Yitschac Hutner zt”l, explica esta ques-

tão de forma brilhante.

Ele diz que este assassino, em dimensões normais, não teria mé-

rito de continuar vivendo. A Torá afirma que ele pode continuar vi-

vendo apenas em uma nova situação, em uma nova dimensão, nas

cidades de refúgio. Todo o tempo que ele estiver fora destas cidades

ele pode ser morto pelo goel hadam.

Sendo assim, entendemos por que se designa um vingador para

quem assassinou um prosélito sem parentes. Porque nesse caso, a

Torá também diz para ele: “Em dimensões normais, você não tem

mais o mérito de viver.”

Agora podemos entender qual a ligação destas palavras, cujo

rashê tevot é elul e o próprio mês de elul. Podemos fazer uma analo-

gia entre o báal teshuvá (quem retorna ao caminho correto da Torá) e

o assassino involuntário.

O mês de elul é a época mais apropriada para a teshuvá. O acrô-

nimo “elul” nas palavras “iná leyadô vessamti lechá” nos ensina que

331

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

existe uma ligação entre o assassino involuntário e o indivíduo que

pecou e precisa fazer teshuvá.

Há uma passagem conhecida no Talmud Yerushalmi (segundo

capítulo do Tratado de Macot) que se encaixa perfeitamente nos con-

ceitos que estamos analisando.

O Yerushalmi cita um versículo do Tehilim e disserta a respeito

dele: “Tov veyashar Hashem – Hashem é bom e correto”. Por que Ha-

shem é bom? Porque Ele é correto. Por que Ele é correto? Por que Ele

é bom.

A continuação do versículo é: “al ken yorê chataim badárech –

portanto, mostra o caminho para os pecadores”. Hashem é bom e

correto, porque Ele mostra o caminho da teshuvá.

E qual o castigo do pecador?

A esta questão, a profecia respondeu que a alma que pecou deve

morrer. A sabedoria respondeu que o mal deve perseguir o pecador.

Hashem respondeu: “Que faça teshuvá e seja expiado seu pecado”.

Essa é a explicação do Talmud Yerushalmi sobre o versículo do

Tehilim que afirma, que Hashem é bom e correto, porque mostra o

caminho para os pecadores; porque Ele mostra aos pecadores o ca-

minho da teshuvá.

Por acaso a profecia e a sabedoria são ruins? Elas querem que o

sujeito morra ou seja perseguido pelo mal? Por que somente o Todo

-Poderoso pode mostrar o caminho da teshuvá?

Se eu estou devendo dinheiro para alguém, um terceiro não

pode perdoar minha dívida. Ele não tem o direito de fazê-lo. O mes-

mo acontece em relação à profecia e à sabedoria. Elas respondem

com naturalidade e objetividade. Elas não têm o direito de desculpar

o sujeito, por que não foi para elas que ele pecou.

Hashem, Que é bom e correto, pode responder: “Que faça teshu-

vá e seja expiado seu pecado”.

332

ELUL

É como se eu pedisse a um amigo um tempo a mais, para pagar

uma dívida que não posso quitar hoje. Somente ele pode responder:

“Tudo bem, eu lhe concedo mais um tempo”.

Assim faz Hashem. Ele prolonga o prazo.

Nós pedimos para Hashem: “Zochrênu lechayim, Mêlech chafets

bachayim, cotvênu bessêfer chayim Lemaanach Elokim chayim – Lem-

bra-nos para a vida, Rei Que deseja a vida; escreve-nos no livro da

vida, por Tua causa, ó D’us vivo”. Nós pedimos para Hashem vida para

viver por Sua causa, para fazer teshuvá. Pedimos mais uma chance

para Hashem. Ele responde: “Tudo bem, você tem mais um ano. Até

o próximo Rosh Hashaná você tem um crédito para Me pagar, para

fazer teshuvá.”

A dissertação do Talmud Yerushalmi sobre o versículo do Tehilim

“Hashem é bom e correto, por isso mostra o caminho para os pecado-

res” está no Tratado de Macot. Algumas linhas antes, está escrito que,

no caminho das cidades de refúgio, havia sinalizações com flechas

indicando o caminho mais rápido para as cidades de refúgio – para

que o assassino involuntário pudesse fugir do vingador.

Estas indicações no caminho do assassino involuntário também

se encaixam no versículo: “por isso mostra o caminho para os peca-

dores”.

O sábio Ritbaz comenta: “Por que entrou esta questão da teshuvá

no tratado de Macot, justamente no capítulo que trata de quem mata

de forma involuntária? Porque antes estava escrito “miclat miclat – re-

fúgio refúgio”, e a teshuvá nada mais é do que miclat, um refúgio para

o indivíduo que pecou.

Depois desta análise do Talmud Yerushalmi e do comentário do

Ritbaz, podemos entender qual é a relação do quinto passuc, que for-

ma o acrônimo elul, sobre o assassino involuntário, e o próprio mês

de elul.

333

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

Este passuc transmite a comovente lição, de que o indivíduo que

pecou, está em uma situação análoga à do assassino involuntário. A

única escapatória para o assassino é a cidade de refúgio, e a única

saída para o indivíduo que pecou é a teshuvá. Elul é a época mais

apropriada para a teshuvá, e devemos aproveitar a bondade de D’us,

Que nos mostra esta opção de fuga.

A Guemará em Pessachim menciona, que algumas coisas foram

criadas antes da Criação do mundo. Uma delas é a teshuvá. Isso sig-

nifica, que a teshuvá também é uma vida em outra dimensão. Em

dimensões normais o pecador não tem mérito para viver. Por isso a

profecia e a sabedoria disseram o que disseram.

Quem revelou o segredo da teshuvá? O Criador! Ele disse: “A so-

lução do pecador é fazer teshuvá e ser expiado”. Ele revelou, que o

pecador tem a chance de viver em uma nova dimensão. A teshuvá foi

criada antes do mundo e está, portanto, acima da natureza.

No início do Shaarê Teshuvá, o Rabênu Yoná escreve em relação

à teshuvá: “Dentre as benfeitorias que o Todo-Poderoso fez com as

Suas criaturas, Ele preparou o caminho para as pessoas se elevarem

de suas atitudes vulgares e banais e fugirem de seus pecados.”

Portanto, a teshuvá é uma fuga. Não uma fuga de nós mesmos;

isso seria grave!

A Guemará escreve sobre o versículo “Lô yihyê bechá el zar – Não

tenha um deus estranho dentro de você”: “Quem é esse ‘deus estra-

nho’ dentro da pessoa? É o yêtser hará – o mau instinto.”

Sendo assim, quando nós não somos nós mesmos? Quando

pecamos. E quando voltamos a ser nós mesmos? Quando fazemos

teshuvá.

Portanto, a teshuvá é uma fuga. Mas não de nós. Pelo contrário, é

uma volta para nós mesmos.

Estes comentários da Guemará e do Rabênu Yoná sobre a teshu-

334

ELUL

vá complementam perfeitamente a dissertação do Talmud Yerushal-

mi. Agora temos uma visão muito clara da relação que existe entre

o assassino involuntário e a teshuvá, que deve ser realizada em elul.

Da mesma forma que alguém, que matou involuntariamente, só tem

possibilidade de vida numa dimensão diferente – fugindo para as

cidades de refúgio – o pecador também precisa de uma dimensão

diferente para viver, a teshuvá, a única chance de fuga para retornar

ao caminho da Torá.

Continuando neste raciocínio (de que a teshuvá é uma fuga que

traz quem pecou de volta para perto de Hashem), a Guemará (Mena-

chot 29) faz uma análise de algumas letras do álef-bêt, que Hashem

escolheu para escrever Sua Torá. Lá, a Guemará explica, que Hashem

criou este mundo com a letra hê e o Mundo Vindouro com a letra yod.

A Guemará continua analisando a letra hê: “Por que este mundo foi

criado com a letra hê? Porque esta letra se parece com um corredor.

Todo aquele que quiser, pode sair.” Sobre isso, Rashi explica: “Sair para

onde? Chas veshalom, para o mau caminho.” O indivíduo tem o livre

arbítrio para fazê-lo.

Depois, a Guemará responde a outras duas questões. Por que

há uma abertura pequena em cima da letra hê? Este é o corredor de

volta para aquele que saiu por baixo, se quiser retornar para o bom

caminho, pois não existe a possibilidade de voltar pelo mesmo cor-

redor que saiu.

Toda essa dissertação representa conceitos profundos e o fato

de não poder voltar pelo mesmo corredor que saiu, parece obscuro

em uma primeira análise. Todavia há uma explicação admirável ci-

tada pelo Rav Eliyáhu E. Desler em nome do livro Menorat Hamaor.

Antes de citá-la, porém, é necessário lembrar de um exemplo do Mi-

drash Cohêlet Rabá, mencionado no livro Shaarê Teshuvá do Rabênu

Yoná.

Logo no início do Shaarê Teshuvá, Rabênu Yoná diz que os peca-

335

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

dos de alguém que tarda em fazer teshuvá pesam mais a cada dia. Ele

traz um exemplo do midrash Cohêlet Rabá.

“Um grupo de marginais foi preso pelo governo. Na prisão, fize-

ram um túnel e escaparam. Mas um deles ficou, embora pudesse ter

fugido junto.

“De manhã, o chefe da prisão encontrou o sujeito sozinho ao

lado do túnel. Bateu nele e disse: ‘Infeliz! Você tem um túnel aberto e

não foge para salvar sua vida?!’”

Rabênu Yoná compara este sujeito com alguém que tem condi-

ções plenas de fazer teshuvá.

Este alguém somos nós. As portas da teshuvá estão abertas. Bas-

ta lembrar, que perguntaram a Hashem o que deve acontecer com

alguém que pecou e Ele respondeu: “Que faça teshuvá e seja expiado

seu pecado”.

Agora podemos trazer a explicação do Rav Desler sobre a pe-

quena abertura da letra hê citada pela Guemará.

O Rav Desler pergunta se existe alguma relação entre esta Gue-

mará e o exemplo do túnel e responde – em nome do livro Menorat

Hamaor – que sim.

Na Guemará consta que, para fazer teshuvá, o indivíduo precisa

voltar pelo vão pequeno da letra hê e não pelo corredor grande. Por

quê? Porque há muitos promotores Celestiais acusando o indivíduo

que está fazendo teshuvá, lembrando seus pecados cometidos. As

acusações são muito consistentes, indicando que D’us não deve re-

cebê-lo de volta. Consta que Hashem então faz um túnel embaixo de

seu Trono Celestial para receber o báal teshuvá.

Qual é este túnel? É a abertura do hê! Como o báal teshuvá não

pode voltar pelo mesmo caminho, repleto de acusadores, é necessá-

rio que Hashem o esconda para recebê-lo.

Assim, logramos o entendimento da Guemará em Massêchet Me-

nachot.

336

ELUL

Sobre todo esse pensamento, Rav Desler acrescenta um outro

conceito. Ele diz que também podemos verificar o quanto a discrição,

de uma forma geral, é importante. Até o Todo-poderoso se conduz

com discrição, escondendo o báal teshuvá dos promotores. Portanto,

esta característica é fundamental, especialmente para aquele que faz

teshuvá.

É interessante notar que, quando falamos de “báal teshuvá”, pela

cabeça de muitos de nós, ele parece um indivíduo muito distante. En-

tão é uma grande mitsvá procurá-lo e trazê-lo de volta ao caminho da

Torá. Certamente isso é verdade. Mas quando o báal teshuvá é men-

cionado, não é somente a ele que nos referimos, mas a todos nós.

Qualquer distanciamento nosso da Torá e das mitsvot, faz com

que precisemos fazer teshuvá e, portanto, sermos chamados também

de baalê teshuvá.

337

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

Os Quarenta Dias

de Rosh Chôdesh Elul Até Yom Kipur

O terceiro capítulo de Cohêlet inicia com o seguinte versículo:

“Cada coisa no mundo tem o seu determinado tempo.” O dia está di-

vidido entre noite e dia, e o ano, em diferentes estações. A chuva e o

sol, por exemplo, somente são convenientes, quando acontecem na

ocasião apropriada.

No âmbito espiritual, muitas mitsvot também possuem um mo-

mento específico para serem realizadas. Comemos matsá em Pêssach,

no mês de nissan, e sentamos na sucá em Sucot no mês de tishri. Até

mesmo as mitsvot que são cumpridas diariamente têm o seu tempo

certo, como os corbanot, que só podiam ser feitos até o meio do dia

na época do Templo Sagrado. A recitação das orações do Shemá e da

Amidá têm, da mesma forma, o seu período apropriado no dia.

Portanto, quando uma mitsvá possui determinado período esti-

pulado para o seu cumprimento, somente aquele tempo é capaz de

elevá-la a altos níveis espirituais. Se essa mesma mitsvá for realizada

em outro tempo, não surtirá este efeito.

Nossos sábios explicam que os 40 dias que se iniciam no primei-

ro dia do mês de elul e terminam no dia de Yom Kipur são chamados

de “yemê ratson verachamim” – dias de boa vontade e piedade. Estes

dias são propícios para a teshuvá – o arrependimento e o retorno ao

caminho correto. Para enfatizar a importância da teshuvá nestes dias,

nossos sábios fizeram uma analogia entre a relação das pessoas para

com D’us e a relação dos súditos para com um rei passeando no cam-

po – “Hamêlech bassadê”. Assim como um rei é mais acessível quando

está passeando no campo, D’us está mais acessível, mais apto a acei-

338

ELUL

tar a nossa teshuvá, neste período. Nestes dias, D’us fica “esperando”

que o povo O procure e faça teshuvá.

Há um conceito muito importante que é indispensável no pro-

cesso da teshuvá. É o fato de que as pessoas sempre podem consertar

suas atitudes e passar a se comportar de outra forma, mais adequa-

da. Isto depende de um trabalho interior voltado às qualidades de

cada indivíduo.

Não é correto alguém afirmar que já está acostumado com de-

terminada rotina, que já possui uma personalidade formada e que

não conseguiria mais alterá-las. É necessário, isso sim, um esforço no

sentido do aperfeiçoamento de suas características; principalmente

no mês de elul, quando há uma “segulá”, uma garantia Divina, de que

a força do mal é mais facilmente dominada pela força do bem. Neste

período, o yêtser hatov – o bom instinto dentro de nós – tem mais

força que o yêtser hará – o mau instinto. Isso torna propícia uma mu-

dança de comportamento para chegar no Dia do Julgamento em um

elevado nível espiritual de teshuvá e com grandes méritos.

No livro “Chayê Adam” (início de Hilchot Rosh Hashaná, clal 138)

consta que, por amar tanto o Povo de Israel, o Todo-Poderoso sempre

gostou de fazer bondades conosco. Assim, quando alguém faz um

pecado, em qualquer dia do ano, pode imediatamente arrepender-

se, fazer teshuvá, e ser perdoado. Ainda assim, os 40 dias que antece-

dem o Yom Kipur são especiais e mais oportunos para que a teshuvá

seja aceita. De onde provém o poder deste período para que seja tão

especial para a teshuvá?

O livro “Pirkê Derabi Eliêzer” responde a isso: Depois que as Tá-

buas da Lei foram quebradas, no dia 17 de Tamuz, Moshê subiu no-

vamente ao Monte Sinai e rezou 40 dias para que D’us perdoasse o

pecado do povo. Depois disso, Moshê subiu ao Har Sinay pela terceira

vez, no dia de Rosh Chôdesh Elul, e rezou mais 40 dias para trazer as

novas tábuas. O dia no qual o Todo-Poderoso aceitou as orações de

339

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

Moshê Rabênu, perdoou definitivamente o povo e entregou as novas

Tábuas da Lei foi o Yom Kipur. Por isso a importância destes 40 dias

que precedem o Yom Kipur.

O livro “Nôam Siach” traz um interessante comentário sobre este

período. O autor traz (pág. 65) em nome de seu pai, o Rav Aharon

Kotler zt”l, que estes dias são especiais para a formação espiritual do

homem. Da mesma forma que um feto, na barriga da mãe, passa por

um processo fundamental de formação do seu corpo, nós passamos

por um processo de formação espiritual nestes dias.

No caso do feto, um pequeno lapso que ocorra nestes dias de

formação, pode provocar danos físicos bem maiores no futuro. O mês

de elul é um mês no qual a parte espiritual do indivíduo se consolida.

Se este processo não for firme e estável, se não houver uma elevação

espiritual contínua, a parte espiritual do indivíduo pode resultar aba-

lada. Para que esta fique completa, nestes 40 dias não pode haver

nenhuma interrupção e desvio de atenção no caminho da elevação

espiritual.

O livro “Nôam Síach” traz ainda o comentário do “Messilat Yesha-

rim” (cap. 25) sobre o “hessêach hadáat” – o desvio de atenção. Com

o hessêach hadáat é muito difícil que o indivíduo consiga adquirir a

yir’at shamáyim (o temor a D’us) necessária. Isso pode acontecer, por-

que ele está ocupado em seu dia-a-dia, ou mesmo de forma proposi-

tada, desviando intencionalmente sua atenção das coisas espirituais.

Na Torá consta, que o rei de Israel tem a obrigação de levar sem-

pre consigo um Sêfer Torá – “vehayetá imô” – e estará consigo. Sobre

isso, a Guemará (San’hedrin 21b) questiona, se ele deve levar o livro

da Torá também ao banheiro ou à casa de banho. A Guemará respon-

de então, que o rei só pode levar o Sêfer Torá a lugares onde possa

estudá-lo também. Sendo assim, fica proibido entrar no banheiro

com ele.

O livro “Sichot Mussar” comenta este trecho da Guemará. O autor

340

ELUL

explica, que a dúvida inicial, se é necessário que o rei leve a Torá até

mesmo ao banheiro, provém do conceito básico tratado anterior-

mente: de que não deve haver nenhuma interrupção para se conse-

guir alcançar o temor a D’us. A sabedoria e o parecer da Torá devem

acompanhar o indivíduo a todos os lugares.

Podemos encontrar vários exemplos na Torá e na Guemará, que

demonstram a necessidade do esforço constante para se alcançar

um elevado nível de yir’at shamáyim – o temor a D’us.

Tanto Avraham Avínu quanto Sará Imênu se esforçaram conti-

nuamente, durante todos os anos de suas vidas, para atingirem um

nível espiritual elevado e ficarem longe dos pecados. No versículo

que conta que Sará viveu 127 anos (Bereshit 23:1), a Torá repete a

palavra “shaná” (meá shaná veesrim shaná vesheva shanim). Rashi ex-

plica, que a Torá quer transmitir a ideia de que, assim como ela não

possuía pecados aos 20 anos, também não possuía com 100 anos.

Segundo esse aspecto, ela continuava no mesmo nível. Rashi explica

também que a passagem “shenê chayê Sará” refere-se ao fato de que

todos os anos da vida de Sará foram “igualmente bons”.

Analogamente, quando a Torá que relata que Avraham Avínu vi-

veu 175 anos, o comentarista Rashi explica que “Com 100 anos de

idade estava no mesmo nível de quando tinha 70, e quando tinha 70

anos estava no mesmo nível de quando tinha cinco”.

Na Guemará também observamos uma dedicação constante,

por parte dos nossos sábios, para atingirem um elevado nível de te-

mor a D’us.

Rabi Akiva, por exemplo, estudou ininterruptamente 24 anos

no bêt midrash – o centro de estudos. Depois dos primeiros 12 anos

de estudos, ele voltou para sua casa. Quando se aproximava de casa,

ouviu sua esposa comentando com uma amiga que, se ela pudes-

se, diria a seu marido que ficasse mais 12 anos estudando. Ao ouvir

isso, Rabi Akiva nem entrou em sua casa, voltou ao bêt midrash e

341

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

estudou por mais 12 anos. Pergunta-se: por que Rabi Akiva nem en-

trou em casa para conversar com sua esposa? A resposta está no

conceito da importância de uma elevação espiritual contínua e inin-

terrupta. Para o sábio, 12 anos de estudos, um dia de interrupção e

mais 12 anos não equivaleriam aos 24 anos de estudos contínuos. O

nível que ele almejava só seria atingido com anos de estudos sem

interrupção.

Portanto, o hessêach hadáat – o desvio de atenção – atrapalha a

aquisição do temor a D’us. Este deve ser algo completo e contínuo,

como um bloco compacto. Assim também, a elevação espiritual do

mês de elul deve formar um bloco, até o final de Yom Kipur.

O “Sichot Mussar” explica também, que há um outro problema

do hessêach hadáat – o desvio de atenção. Ele enfraquece o efeito

das mitsvot. Quando um indivíduo tem a possibilidade de cumprir

uma mitsvá, mas desvia sua atenção do objetivo e não a executa

imediatamente, é prejudicial na busca da elevação espiritual. O au-

tor traz uma passagem do Talmud (Ketubot 62b) condizente com

este princípio:

Rabi Shim’on Bar Yochay, na ocasião de seu casamento, pediu a

seu amigo, Rabi Chananyá Ben Hachinay, que o esperasse até o final

dos sete dias de festividades – chamados de “sheva berachot” – para

irem juntos estudar no bêt midrash. Rabi Chananyá esperou Rabi

Shim’on Bar Yochay por três ou quatro dias, mas depois disso não es-

perou mais e foi estudar durante doze anos no bêt midrash.

A pergunta imediata que surge é: por que Rabi Chananyá Ben

Hachinay não esperou mais três dias? Que diferença faria postergar

três dias dos doze anos de estudos?

O “Sichot Mussar” continua explicando, que quando um indiví-

duo assume uma boa decisão, deve executá-la imediatamente. Não

deve nem mesmo esperar poucos dias. Assim, Rabi Chananyá decidiu

que era preferível realizar, sem mais delongas, sua decisão de ir estu-

342

ELUL

dar no bêt midrash, mesmo sabendo, que perderia a oportunidade de

ter um chavruta – um companheiro de estudos – do porte do grande

sábio Rabi Shim’on Bar Yochay.

Se um indivíduo decide cumprir uma mitsvá, mas não a realiza

imediatamente, quando ela for cumprida não terá a mesma força. O

ato deve suceder imediatamente a decisão.

Os 40 dias, desde o primeiro dia do mês de elul até Yom Kipur,

são especiais para a teshuvá. Devemos aproveitá-los para alcançar

uma elevação espiritual contínua e sem desvios de atenção. Segun-

do os conceitos judaicos, sempre é possível efetuar uma mudança de

comportamento e de características. Além disso, para alcançarmos o

melhor efeito de cada mitsvá, é importante ter em mente a necessi-

dade de concluir seu cumprimento, assim que tomarmos a decisão

positiva.

343

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

Preparativos Para o Mês de Elul

Consta na Meguilat Ester (4:2) a seguinte passagem: “Vayavô ad

lifnê sháar hamêlech, ki en lavô el sháar hamêlech bilvush sac” – E veio

Mordechay até a frente do portão do rei, e não se deve vir ao portão do

rei com roupas de saco (em sinal de luto).

Sabe-se que em toda a Meguilat Ester não figura o nome de D’us,

mas as passagens que trazem “hamêlech” – o rei – referem-se dire-

tamente ao Todo-Poderoso. Portanto, essa passagem que menciona

que não se deve vir ao portão do rei (hamêlech) com vestimentas de

saco, refere-se, conforme comentários de nossos sábios, ao fato de

que não se deve chegar nos dias próximos de Rosh Hashaná e Yom

Kipur (o mês de elul e os 10 dias de Rosh Hashaná até Yom Kipur) com

“roupas sujas”.

Os dias do mês de elul e Assêret Yemê Teshuvá (os Dez Dias de

Penitência de Rosh Hashaná a Yom Kipur), são dias em que o Criador

está mais próximo de nós, o que exige de nós uma apresentação dife-

rente perante Ele. Da mesma forma que temos vestimentas para nos-

so corpo e zelamos para que estejam sempre limpas, principalmente

em ocasiões especiais, temos também nossa vestimenta espiritual.

Nossos sábios nos ensinam que nossa neshamá (alma) tem suas ves-

tes, que são o cumprimento das mitsvot e o estudo da Torá. É muito

importante manter estas vestimentas sempre limpas, ou seja, sem

pecados, e mais ainda nesses dias que precedem os Yamim Noraim

(os Dias Temíveis).

O livro “Or Yisrael” do rabino Yisrael Salanter zt”l (pág. 60) traz

que em tempos passados, os judeus se estremeciam ao ouvir falar

que se aproximava o mês de elul. Era tal o efeito, que eles sentiam a

344

ELUL

necessidade de se aproximar de D’us, de Sua Torá e Suas mitsvot, cada

um de acordo com seu nível. Percebiam que se haviam distanciado

do Criador durante o ano e que a única forma de reaproximarem-se

Dele era se protegendo através do estudo da Torá e do cumprimento

das mitsvot.

O profeta Yesha’yáhu (58:6) escreve: “Halô zê tsom evcharêhu pa-

têach chartsubot resha hater agudot motá...” – O jejum escolhido por

D’us é aquele no qual se desata o nó dos pecados. Quando os peca-

dos se excedem, são comparados a uma corda com muitos nós. É

necessário desatar os pecados que foram amarrados durante o ano e

este trabalho deve ser feito principalmente quando se aproximam os

Yamim Noraim. Para isso, o Criador nos deu o mês de elul, chamado

de “Chôdesh Harachamim” – o mês da piedade – quando temos uma

oportunidade especial de cancelarmos nossos pecados por meio da

teshuvá (o retorno).

O Rei Shelomô escreve (Cohêlet 7:17): “al tirshá harbê” – não

faça muitos males. Não precisaríamos do auxílio da sabedoria do Rei

Shelomô, considerado o homem mais sábio da Terra, para dar um

conselho aparentemente tão simples. O Rabino Natan Meir Wacht-

foigel Shelita nos diz (“Côvets Sichot” vol. I, pág. 215) que Shelomô

Hamêlech intencionava nos transmitir o seguinte raciocínio (citado

no “Shaarê Teshuvá” sháar 1,7): Quando repetimos um pecado segui-

das vezes, ele passa a ser encarado de forma diferente; não é apenas

um pecado, mas é encarado agora como “harbê” – muito. Mesmo

que este pecado seja enquadrado entre os pecados menos graves da

Torá, por ser repetido constantemente, fica sendo considerado grave.

Por exemplo, um pecado proveniente de más qualidades, reflexo de

um mal de raiz causador de outros males, é considerado um pecado

de “harbê” (muito). Portanto, cabe a nós neste período de elul, refle-

tirmos sobre esta situação e desatar os nós dos pecados para que

saiamos desta situação de “harbê”.

345

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

O mesmo raciocínio consta também no “Shaarê Teshuvá” (sháar

3 par. 203) quando explica a razão do lashon hará ser tão grave, pon-

derando que mesmo um pecado considerado entre os menos graves,

quando repetido muitas vezes passa a ter uma gravidade maior.

No que diz respeito às mitsvot e às averot (pecados) de uma for-

ma geral, o que faz com que uma mitsvá tenha um valor superior, ou

que um pecado tenha um valor grande?

Com relação às mitsvot, consta no Pirkê Avot (5:24): “Ben Hê Hê

omer lefum tsaará agra” – (O sábio) Ben Hê Hê diz: conforme o esforço

(feito para se fazer a mitsvá), assim é sua recompensa. Não é a mesma

recompensa para alguém que estudou a Torá em uma determinada

hora quando estava tranquilo, sem preocupações ou incômodos e

para alguém que estudou quando suas preocupações eram muitas

e não estava tranquilo, mas apesar disso fez um esforço para vencer

sua natureza e concentrou-se no estudo da Torá. Nesse caso, sua re-

compensa é muito maior do que quando estudou ao estar tranquilo

e sossegado.

É assim também com relação ao pecado. De qualquer forma

existe punição para todos os pecados, no entanto, varia de acordo

com as circunstâncias que levaram à transgressão. Existe uma grande

diferença no caso de o indivíduo ter podido evitar facilmente este

procedimento errado e não o fez, se as circunstâncias eram tais que

dificultavam muito evitar o pecado, ou se quando o praticou, sentiu

remorso por estar agindo desta forma. O fato de fazê-lo com remorso

diminui muito a gravidade do pecado.

Da mesma forma, se as circunstâncias dificultavam evitar o peca-

do e mesmo assim esforçou-se para não cair no erro, a recompensa é

maior do que simplesmente evitá-lo em circunstâncias normais.

O Rabino Chayim Vital zt”l, em seu livro “Shaarê Kedushá” (pág.

10), nos dá uma recomendação chave para cumprirmos as mitsvot

da Torá e para evitarmos sua transgressão. Ele diz que devemos tra-

346

ELUL

balhar nosso interior e esforçarmo-nos por adquirir boas qualidades,

como a humildade, a bondade, a misericórdia, a paciência, para con-

seguirmos preservar as mitsvot e evitar sua transgressão.

Nos dias de elul e de Assêret Yemê Teshuvá, devemos procurar

nos aproximar do Criador para nos apresentarmos no Dia do Julga-

mento com roupas limpas. Nesta época, temos uma obrigação maior

de tentar desatar os nós dos pecados, inclusive aqueles que se re-

petem frequentemente e já se tornaram um hábito. Neste sentido,

as boas qualidades de cada pessoa devem ser trabalhadas para se

conseguir observar as mitsvot.

347

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

Como Encarar o Mês de Elul

O Elo Entre as Últimas Sete Parashiyot

da Torá

As sete últimas parashiyot da Torá (Shofetim, Ki Tetsê, Ki Tavô, Nit-

savim, Vayêlech, Haazínu e Zot Haberachá) normalmente são lidas a

partir do início do mês de elul e prolongam-se até Simchá Torá. Estas

parashiyot têm um elo entre si e sua leitura, neste período do ano,

vem nos ensinar como encarar o mês de elul, denominado Chôdesh

Harachamim (o mês da piedade) e os dez dias de Rosh Hashaná a Yom

Kipur, denominados Assêret Yemê Teshuvá (os Dez Dias de Penitên-

cia). Estes quarenta dias são consagrados de forma especial para a

teshuvá (o arrependimento) e a reflexão sobre nossas atitudes.

A primeira parashá deste ciclo, Parashat Shofetim, inicia-se com

o seguinte versículo (Devarim 16:18): “Shofetim veshoterim titen lechá

bechol shearecha” – Juízes e policiais designarás em todos os teus por-

tões (cidades). Conforme os conceitos do judaísmo, cada indivíduo é

o juiz e o policial de si mesmo. É necessário que faça, constantemen-

te, uma análise e um julgamento de suas atitudes para verificar se

estas condizem com os mandamentos da Torá, quer no aspecto de

mitsvot ben adam Lamacom (mitsvot entre o indivíduo e o Criador),

quer de mitsvot ben adam lachaverô (mitsvot entre o indivíduo e seu

semelhante). Nada mais justo e correto, então, do que iniciar este pe-

ríodo dando ênfase a esta análise.

Consta no livro “Shenê Luchot Haberit” que os “shearim” (por-

tões) citados neste primeiro passuc da parashá referem-se também

aos órgãos do corpo humano que possuem orifícios, como os olhos,

348

ELUL

os ouvidos e a boca. Devemos zelar pela integridade espiritual destes

órgãos empregando-os para as boas ações e não comprometê-los

utilizando-os de forma contrária à vontade do Criador.

Sobre os olhos, a Torá nos adverte (Bamidbar 15:39): “Velô tatúru

acharê levavchem veacharê enechem” – Não desviareis atrás de vossos

corações e vossos olhos. Sobre os ouvidos, fomos ordenados a usá-los

para ouvir os assuntos da Torá e coisas boas que sejam de proveito à

pessoa, não ouvindo lashon hará (maledicência). Em relação à boca,

a Torá nos diz (Devarim 6:7): “vedibartá bam” – e falarás assuntos da

Torá. Por meio do poder da fala pode-se tanto construir como des-

truir. Não somente em relação aos outros, mas também em relação

a si mesmo, conforme disse o Rei Shelomô em “Mishlê” (18:21): “Má-

vet vechayim beyad lashon”– Morte e vida estão em poder da língua,

e ainda (21:23): “Shomer piv ulshonô shomer mitsarot nafshô” – Quem

resguarda sua boca e sua língua, preserva sua alma de desgraças. É res-

ponsabilidade da boca, ainda, uma tarefa de suma importância: zelar

para que a pessoa não consuma alimentos proibidos pela Torá, como

carnes e peixes não casher, leite misturado com carne e alimentos

cozidos por não judeus (bishulê goyim).

Em seguida à Parashat Shofetim vem Parashat Ki Tetsê (Devarim

21:10): “Ki tetsê lamilchamá al oyevecha” – Quando saíres à guerra con-

tra teu inimigo. Consta nos livros sagrados que nosso maior inimigo

é o yêtser hará – o mau instinto – que todos os dias nos provoca, es-

perando que pequemos, conforme nos diz o Talmud (Kidushin 30b):

“Yitsrô shel adam mitgaber alav col yom” – O yêtser hará diariamente

procura apoderar-se do ser humano. Uma das tarefas árduas durante

todos os dias de nossas vidas é, portanto, vencer nosso yêtser hará. O

próprio Talmud (Berachot 5a) nos diz: “Leolam yarguiz adam et yêtser

hatov al yêtser hará” – O ser humano deve sempre combater o yêtser

hará com o yêtser hatov (o bom instinto), pois se a pessoa deixar o yêt-

ser hatov passivo, evidentemente o yêtser hará vencerá o conflito.

349

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

Após estas duas fases de análise e autojulgamento, colocando

o yêtser hatov contra o yêtser hará, encontramos a parashá Vehayá Ki

Tavô – quando chegares. A palavra “vehayá” (primeira palavra desta

parashá) é usada em situações de alegria, o que não acontece com

a palavra “vayhi”, usada em situações de tristeza, como em (Meguilat

Ester 1:1): “Vayhi bimê Achashverosh” – E foi nos dias de Achashverosh,

na história de Purim, quando foi decretada uma calamidade para o

Povo Judeu. Nesta parashá, a alegria que esta palavra expressa é o

fato de o indivíduo ter o seu autojulgamento e autocontrole e não o

contrário – estar à mercê do yêtser hará.

No Shabat anterior a Rosh Hashaná lê-se normalmente as pa-

rashiyot Nitsavim e Vayêlech. Na Parashat Nitsavim consta (Devarim

29:9): “Atem nitsavim hayom culechem lifnê Hashem Elokechem” – Vo-

cês todos se apresentam hoje perante o Todo-Poderoso. Os livros sagra-

dos explicam que o dia a que este versículo se refere é o dia de Rosh

Hashaná, quando toda a humanidade é julgada pelo Todo-Poderoso.

Quando está marcada uma data para um julgamento em um tri-

bunal civil, o réu prepara-se de inúmeras maneiras: contrata o melhor

advogado e procura testemunhas que possam ajudá-lo. Quando tra-

ta-se do julgamento perante o Criador, em Rosh Hashaná, o indivíduo

pode sair-se bem quando fizer uma preparação preliminar. Mais do

que em julgamentos terrestres, o indivíduo necessita de bons advo-

gados e testemunhas a seu favor, que são suas próprias atitudes, as

mitsvot e os maassim tovim. Quanto mais atos bons conseguir acu-

mular neste período, tanto melhor será sua defesa frente ao Tribunal

Celestial. Isto é possível de alcançar se fizermos uma autoanálise de

nossas atitudes para conseguir sobrepujar o yêtser hará e apresentar-

mo-nos perante o Criador em Rosh Hashaná com muitas “testemu-

nhas de defesa”.

Na parashá seguinte, Parashat Vayêlech, a Torá nos relata que

Moshê já estava com 120 anos e mesmo assim continuava galgando

350

ELUL

a escada espiritual, pois não há limites para os degraus espirituais.

Enquanto vivas, as pessoas devem procurar se elevar constantemen-

te, e isto é o que a parashá quer dizer com “vayêlech Moshê”. Daqui

concluímos que, mesmo que a priori tenhamos nos saído bem no jul-

gamento de Rosh Hashaná graças à bagagem espiritual que adquiri-

mos antes do julgamento, não devemos nos satisfazer com isso, mas

sim, almejar graus espirituais mais elevados. Para isso vem a parashá

seguinte com um novo ensinamento: “Haazínu hashamáyim vaada-

bera vetishmá haárets imrê fi” – Ouvi, ó Céus, e falarei; e ouça a Terra aos

ditos de Minha boca. Aqui, “os Céus” se refere à nossa parte espiritual,

nossa alma, e “a Terra” se refere à nossa parte material, nosso corpo.

Para que tenhamos uma integração entre ambos e para que nosso

corpo auxilie nossa alma em sua tarefa aqui na Terra é necessário que

tenhamos atenção constante.

A última parashá da Torá nos diz (Devarim 33:1): “Vezot habera-

chá” – Esta é a bênção. Para recebermos a bênção do Todo-Poderoso é

necessário realizar Sua vontade estudando a Torá e cumprindo Suas

mitsvot. Quando todas as etapas que as parashiyot anteriores nos en-

sinam tiverem sido superadas, poderemos ter a certeza de que nos-

sas atitudes serão coroadas de êxito.

351

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

O Mês de Elul

O Caminho da Ascensão na Torá e nas Mitsvot

A partir do Shabat no qual se anuncia o mês de Elul até Shemini

Atsêret, lê-se desde a Parashá Reê até a Parashá Vezôt Habe­rachá. Va-

mos tentar, neste ensaio, escrever uma ideia que combina com cada

uma dessas porções semanais e ligá-la ao mês de Elul.

Elul é o mês no qual despertamos para fazer teshuvá, para me-

lhorar nossos atos e aproximar-nos de D’us – Que anseia por nossas

preces, nossos bons atos e nossa teshuvá, feita de todo o coração.

Reê – “Veja: Eu estou colocando diante de vocês, hoje, a

bênção e a maldição...” (Devarim 11:26).

Tentarmos explicar este versículo de acordo com o que diz o

Gaon de Vilna.

Reê – “Veja”. D’us se dirige ao Povo de Israel no singular. Isto é

assim, porque a possibilidade de escolher entre o bem e o mal e en-

tre a bênção e a maldição é dada a cada um em p­articular.

Cada ser humano é um mundo por si só e o trabalho de retifica-

ção dele deve ser feito, principalmente, dentro do seu coração. Cada

um é diferente do outro e seus corações são diferentes no que diz

respeito às inclinações, desejos, experiências, etc. Portanto, o cami-

nho de teshuvá (retorno) de cada um é diferente do caminho de seu

semelhante e é por isso que a Torá se dirige a cada um em particular.

“Veja”; reflita sobre a grande bênção e sobre a maldição – e escolha

o bem!

Anochi – “Eu”. D’us, Ele próprio, é quem se dirige ao indivíduo

352

ELUL

e lhe aponta os dois caminhos possíveis, o desejável – no qual se

deve andar – e o dos testes e da incitação do mau instinto, do qual

se deve escapar.

Sobre o ser humano recai a responsabilidade de prestar aten-

ção e se comportar com seriedade, pois ele se encontra constante-

mente perante D’us.

Noten – “Estou colocando” – no presente. A cada instante há

um novo teste, a todo momento o indivíduo se encontra perante a

possibilidade de escolher entre o bem e o mal.

Esta escolha não pertence ao passado, nunca se chega neste

mundo em uma época de descanso, em um período no qual tudo o

que é necessário fazer já foi executado. É necessário escolher sem-

pre o bem e ficar constantemente alerta para repelir as investidas do

mau instinto. Uma pessoa que estiver atenta terá o mérito, se D’us

quiser, de avançar com segurança e não tropeçar.

Lifnechem – “Diante de vocês”. Tanto o bem quanto o mal

estão postos ante o homem, ambos estão ao alcance de suas mãos.

O homem é capaz de conseguir cumprir as mitsvot e temer a

D’us de uma forma pura, pois “ela não está nos Céus... e ela não está

além do mar” (Devarim 30:12-13). Por outro lado, ele pode também

cair e pecar, D’us nos livre. Isto requer do homem um grande cuida-

do e preces constantes para receber ajuda dos Céus.

Hayom – “Hoje”. O retorno em teshuvá modifica o homem au-

tomaticamente. Ele é considerado, neste sentido, como um recém-

nascido. A teshuvá é um novo começo.

Que não se desespere o homem em face de seus numerosos

fracassos ou por não ter conseguido alcançar resultados espirituais

dignos de nota, apesar dos anos que passam. Ele deve saber que a

força da teshuvá é enorme e é capaz de tirá-lo, em poucos instantes,

da escuridão para a luz.

353

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

Shofetim – “Juízes e Guardas Porás em Todos os seus Portões...”

“Juízes e guardas porás em todos os seus portões” (Devarim

16:18). Os Mestres da Ética Judaica (Baalê Hamussar) explicaram que

este versículo alude ao caminho que o ser humano deve tomar no

serviço Divino. Ele deve postar em seu caminho juízes e guardas que

lhe indiquem a verdade.

O “juiz” é o conhecimento que a pessoa tem após ter estudado

as leis da Torá. Seu conhecimento a guiará em relação ao que é per-

mitido e o que é proibido, o que é opcional e o que é obri­gatório.

O “guarda” é o temor a D’us. Ele impede que a pessoa transgrida

mandamentos e cometa erros. A unificação perfeita dos “juízes” e dos

“guardas” constrói uma pessoa perfeita.

É necessário acrescentar que os “guardas” e os “juízes” só cum-

prem sua função com sucesso, quando o homem já segue pelo

caminho correto. Ou seja, quando ele já escolheu o bem, como foi

explicado em relação a Parashat Reê. Eles então auxiliam a pessoa a

prosseguir, avançar e conseguir resultados espirituais em seu cami-

nho positivo.

Além disso, os guardas e os juízes devem ser colocados “em to-

dos os seus portões”. O indivíduo deve vigiar todos os seus órgãos e

seus “portões”: a boca, os olhos, os ouvidos e outros. Somente deste

modo, ele poderá se resguardar e prosseguir, em seu caminho, sem

tropeçar nos graves pecados que estão ligados à alimentação e à fala,

à visão e à audição.

Ki Tetsê – “Quando Saíres Para a Guerra Contra teus Inimigos...”

“Quando saíres para a guerra contra teus inimigos e D’us os colo-

car em tua mão” (Devarim 21:10). O pior inimigo do homem é o mau

instinto. Ele é um inimigo forte, enérgico e que nunca desiste. O úni-

co modo de vencê-lo é empreender uma guerra geral de prevenção

354

ELUL

contra ele. Aquele que fica passivo e pensa que o mau instinto não

poderá derrotá-lo comete um grave erro.

São conhecidas as palavras do sábio que encontrou um grupo

de guerreiros voltando de um combate, após terem derrotado seus

inimigos. “Vocês venceram a guerra fácil” – disse. “Perante vocês, po-

rém, ainda se encontra a guerra mais difícil – a guerra contra o mau

instinto”.

Apesar da dificuldade da guerra, a Torá nos promete: “e D’us os

colocar em tua mão”. Aquele que guerrear terá a ajuda de D’us e po-

derá considerar a vitória como certa.

Guerra significa agilidade e atenção. Guerra significa encoraja-

mento e distância do desespero. Guerra significa o uso de todas as

forças: fortalecimento e coragem.

Quem sair assim para a guerra terá o mérito de servir a seu Cria-

dor com fé; o mau instinto não conseguirá atrapalhá-lo nisto. Ele terá

sucesso em eliminar as forças do mau instinto e servir a D’us confor-

me o seu anseio e conforme lhe foi ordenado na Torá.

Ki Tavô – “E Será, Quando Vieres Para a Terra...”

“E será, quando vieres para a terra que D’us, teu Senhor, está

te dando como uma herança, ocupando e assentando nela” (Deva-

rim 26:1). A linguagem “e será” (vehayá) é uma linguagem de alegria,

diferente de “vayhi” que é linguagem de tristeza, como em “Vayhi

bimê Achasheverosh”. A parashá trata do oferenda dos bicurim – as

primícias. A pessoa está contente com a renovação, com as primeiras

frutas e com a bênção que D’us mandou em sua produção agrícola.

Pode haver alegria também no plano espiritual, quando o indiví-

duo alcança seu objetivo e vê frutos, que são suas conquistas espiri-

tuais, sem quedas e sem transgressões. Isso se torna possível após a

vitória na guerra contra o mau instinto, como foi explicado.

355

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

Enquanto o mau instinto subjugar a pessoa e embaralhar seu

caminho com ilusões; enquanto ela for dominada por más qualida-

des como inveja, desejo e busca de honra, ódio, raiva e orgulho – a

alegria estará muito distante dela.

A alegria vem junto com a plenitude. Quando o indivíduo é ínte-

gro em seu caminho, a alegria explode em seu coração.

A linguagem “e será” (vehayá) aparece também no início de Pa-

rashat Êkev: Vehayá – “E será, por ouvirdes essas palavras...”. A audição

da Voz de D’us e o cumprimento de Seus mandamentos devem ser

feitos com alegria e satisfação. “E será, quando vieres para a terra”.

Quando a pessoa chega em sua “Terra Prometida”, no sentido espiri-

tual – ou seja, no legado que D’us lhe destinou em sua vida – poderá

se alegrar e agradecer a D’us com todo seu coração.

Nitsavim

“Vocês Estão Hoje de Pé, Todos, Diante de D’us, seu Senhor”

“Vocês estão hoje de pé, todos, diante de D’us, seu Senhor”. Ex-

plicam os livros sagrados, em nome do Zôhar Hacadosh, que isso se

refere ao Dia do Julgamento, no qual todas as criaturas do mundo se

apresentam perante D’us para serem julgadas.

Aquele que passou por todos os estágios descritos até agora: a

escolha do bem, o apontamento de “juízes” e “guardas”, a vitória so-

bre o mau instinto e a alegria com o cumprimento das mitsvot – está

apto a ser julgado por D’us e ser declarado virtuoso.

Acrescentemos aqui que no passuc “Vocês estão hoje de pé, to-

dos...” está inclusa também a ideia de que o Povo de Israel, em sua

fonte, constitui uma só unidade. Ou seja, todos se apresentam peran-

te D’us no Dia do Julgamento.

Estas palavras adquirem um significado especial em relação à

absolvição da coletividade e à vontade de defender e acrescentar

356

ELUL

méritos a todo o Povo de Israel. Os pecados do próximo aumentam a

pesada carga de “dívidas” do povo e influenciam também no que diz

respeito àqueles que não pecaram, pois é impossível separar total-

mente, umas das outras, as almas de Israel.

Portanto, é muito importante acrescentar méritos para a Nação,

aumentar o estudo da Torá em multidões, aproximar pessoas afasta-

das e ver o bem e a preciosidade que se encontra em Israel.

Aquele que trilhar esse caminho terá o mérito de se apresentar

perante D’us com todos os membros de seu povo – e poderá se sal-

var no Dia do Julgamento.

Vayêlech – “E foi Moshê...”

“E foi Moshê”. De acordo com o que é explicado nestes versí-

culos, Moshê Rabênu tinha, então, 120 anos. Durante toda sua vida,

ele continuou a ascender nos níveis espirituais – até se tornar o mais

perfeito entre os perfeitos, mestre dos profetas e possuidor de todos

os degraus espirituais concebíveis. Se não fosse por seu falecimento,

continuaria a ascender, apesar de sua perfeição e de sua idade avan-

çada. “E foi Moshê” – um prosseguimento e um progresso sem fim.

Estas palavras contrariam o que pensam muitas pessoas comuns.

Estas sustentam a tese de, após muitos anos de serviço Divino, terem

o direito de estacar e parar onde estão. Moshê Rabênu contradiz esta

ideia com o seu modo de vida.

Também o Rei Shelomô, de abençoada memória, diz: “um cami-

nho de vida é para o inteligente – para que se abstenha de descer

precipício abaixo” (Mishlê 15:24). O único modo de não despencar

para baixo é uma trilha de vida de elevação constante.

“E eu darei a você andanças entre estes que estão parados” (Ze-

charyá 3:7). O ser humano é um ser que caminha, avança e se eleva.

Nesse aspecto, ele é superior aos anjos que, com toda sua estatura,

357

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

são considerados “fixos” em seu lugar. Enquanto o homem avança,

é prometido a ele que não regredirá. Esta é a essência de sua vida

e sobre isso está baseada a vida judaica, também na velhice, até os

últimos dias do indivíduo.

Haazínu – “Ouçam os Céus e Falarei...”

Haazínu Hashamáyim – “Ouçam os Céus e falarei – Vetishmá

Haárets e ouvirá a terra o discurso de minha boca” (Devarim 32:1).

O Or Hachayim Hacadosh esclarece que “os Céus” indicam a alma, a

parte espiritual da pessoa, enquanto “a terra” indica o corpo.

O passuc fala sobre a união dos Céus e da Terra, com os dois pres-

tando atenção e ouvindo as palavras de D’us. Podemos acrescentar,

de acordo com o que explicamos anteriormente em “Parashat Vayê-

lech”, que esta união é possível àquele que atinge o objetivo de sua

vida; àquele que progride e ascende sempre nos degraus da Torá e

das mitsvot. Para este, tudo é direcionado à espiritualidade. Também

o corpo serve à alma e ambos, juntos, escutam as palavras de D’us.

Vezot Haberachá – “E Esta é a Bênção...”

“E esta é a bênção” (Devarim 33:1). Uma pessoa que passa por

todos esses estágios tem o mérito de atingir níveis sublimes e eleva-

dos e avança, constantemente, para alcançar sua meta espiritual. So-

bre este indivíduo paira a bênção – a bênção dos Céus – que auxilia

e que concede uma abundância de santidade ao que caminha com

integridade.

A Definição de uma “Pessoa” Pelo Caminho da Torá

É conhecida a história de um dos grandes filósofos de Atenas

que saía pelas ruas, em pleno dia, com uma tocha nas mãos. Quando

358

ELUL

lhe perguntavam por que fazia isso, ele respondia: “estou procurando

um homem”.

Consta sobre esta história no livro Alê Shur (parte 1, página 19):

“Isso aconteceu em Atenas. Ali se perguntavam como viver e procu-

ravam desesperadamente por uma ‘pessoa’ de verdade. Em Jerusa-

lém, não era necessário perguntar. Ali sabiam como viver e ali sempre

houve, em todas as épocas, pessoas de verdade”.

“Como se deve viver? ‘E (vocês) guardarão meus estatutos e mi-

nhas leis, que o indivíduo fará e com elas viverá’ (Vayicrá 18:5). O Cria-

dor da vida também nos revelou como preenchê-la. Pequeno é, o

recipiente da vida, para receber todo o enorme conteúdo que o Cria-

dor do mundo nos deu para pôr nele. Entretanto, cada canto desse

recipiente é repleto de pensamento, fala e ação. Não há um instante

vazio na ‘vida de acordo com a Torá’”.

“Não é necessário procurar o ‘Homem de Torá’ com tochas. Des-

de Moshê Rabênu até o último dos profetas, de Ezrá Hassofêr até

Shim’on Hatsadic, até Rabênu Hacadosh e até Abayê e Ravá; até nos-

sos mestres, o Rambam (Maimônides) e o Ramban (Nachmânides),

o Mechaber (autor do Shulchan Aruch, Rav Yossef Caro) e o Gaon de

Vilna, o Chafêts Chayim e o Chazon Ish – a ‘Torá do homem’ gerou o

homem completo a cada geração”.

“Os nomes que lembramos são apenas os de indivíduos íntegros

que se tornaram notáveis por seus livros e por suas obras. Porém, eles

não estavam sozinhos em sua geração. Junto a eles, havia milhares

de pessoas eminentes e plenas que não se tornaram célebres ou que

se tornaram, mas não se tornaram conhecidos para toda a Casa de

Israel”.

A Torá nos mostra o caminho da vida plena. Bem-aventurados

somos por D’us, bendito seja, por preencher nossa vida com diretri-

zes claras, por sermos capazes de cumprir Sua vontade e ascender

sem limites.

359

ROSH HASHANÁ, YOM KIPUR & SUCOT

Aquele que completa sua meta no mundo é chamado de “ho-

mem” e é considerado o exemplo procurado pelos sábios dos outros

povos. Porém, parece, sua procura é vã – pois alguém sem Torá não

merece a definição de “homem”.

As Mitsvot de D’us Santificam a Vida

No livro Bên Shêshet Leassor (página 34), o Rabino Shelomô Wol-

be (shelita) zt”l escreve:

“D’us se revelou aos nossos antepassados no Monte Sinai e, na-

quele dia, vimos que D’us pode falar com o homem e este (continuar)

a viver. Ele, bendito seja, revelou-se em nosso mundo – Seu mundo

– e, desde então, não sai de nós a lembrança do D’us Único, Mestre

da vida e Rei do mundo”.

“Como podemos viver perante D’us? Pois Ele é Elevado e Exal-

tado, Santo e Temível. Será que devemos fugir da vida corpórea, de

nosso mundo material, para sermos meritórios perante Ele?”

“De modo algum! Viveremos perante Ele dentro do corpo e den-

tro do mundo. Santificaremos o corpo e a nossa vida neste mundo.

Elevaremos nosso mundo até que não haja contradição entre ele e a

presença de D’us dentro dele”.

“Com o que o santificaremos? Com Seus mandamentos! Cade-

shênu Bemitsvotêcha – ‘Santifica-nos com Teus mandamentos’!”

“O que é mitsvá (mandamento) e o que é kedushá (santidade)?”

“As palavras da berachá sobre qualquer mandamento que um

indivíduo vai cumprir são as seguintes: “A Fonte das Bênçãos és Tu,

Hashem, nosso D’us, Rei do Universo, Que nos santificou com Seus

mandamentos. Metade do texto está dirigido abertamente à uma

segunda pessoa (“A Fonte das Bênçãos és Tu”) – lashon nocheach –

e metade fala sobre uma terceira pessoa que está oculta (“Que nos

santificou com Seus mandamentos”) – lashon nistar. O Ramban

360

ELUL

(Nachmânides), nosso mestre, explica que o texto é assim, porque as

mitsvot foram dadas desde sempre e para sempre”.

“Podemos entender suas profundas palavras, superficialmente,

do seguinte modo: uma vez que as mitsvot são o elo entre o mundo

espiritual e o mundo material, também sua bênção é recitada tanto

com uma linguagem revelada (lashon niglê) como com uma oculta

(lashon nistar). Quando nos referimos aqui a “oculto”, aludimos a algo

intelectual – e não a segredos místicos incompreensíveis. A espiritua-

lidade não é menos real que o material em nosso mundo.

Também o ser humano é metade revelado e metade oculto. Ele

possui muitas forças aparentes, das quais se utiliza em sua vida co-

tidiana. Porém, justo suas capacidades mais elevadas se encontram

adormecidas: sentimentos profundos, elevação de espírito, amor à

misericórdia e muitas outras forças. Eis que ele necessita das mitsvot

para despertar o lado encoberto e oculto de sua personalidade e li-

gar essa parte oculta com a parte revelada que há nele”. Até aqui são

as palavras do Rav Wolbe.

De acordo com isso, podemos entender a grande contribuição

da Torá e das mitsvot práticas para o ser humano. Elas ligam os sen-

timentos profundos à vida ativa e santificam a existência física. Nós

não temos a presunção de explicar a profundidade dos verdadeiros

motivos das mitsvot. Porém, é importante que saibamos que elas be-

neficiam muito nossa vida, tornam possível que estejamos ligados a

D’us e que vivamos de acordo com nossa sagrada Torá.